Prevenção ao suicídio: como o uso de agrotóxicos influencia no aumento de casos
Pesquisas apontam que “há fortes indícios de que o problema possa estar relacionado à cultura do fumo e aos agrotóxicos usados nas lavouras”
Conforme dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2021, divulgado em julho pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, revelam que o número de suicídios no Brasil em 2020 foi de 12.895, com variação de apenas 0,4% em relação a 2019, quando foram registrados 12.745 casos.
Registros de suicídios locais
Um dos fatos que mais chamam a atenção dos técnicos do Ministério da Saúde é a concentração de registros de suicídios em algumas áreas do País. A Região Sul apresenta 23% dos casos, embora responda por 14% da população brasileira. No Sudeste, região que concentra 42% da população, foram registrados 38% dos suicídios registrados no País.
O Rio Grande do Sul é acompanhado pelo Ministério da Saúde há 10 anos. Há fortes indícios de que o problema possa estar relacionado à cultura do fumo e aos agrotóxicos usados nas lavouras. “Pesticidas com manganês aumentam o risco de provocar danos ao sistema nervoso central”. “Além do suicídio, a ação do pesticida está associada a outros agravos, que também precisam ser avaliados, como câncer e más-formações congênitas.
Em 1996, o assunto ganhou as páginas da imprensa brasileira e internacional quando uma epidemia de suicídios atingiu a cidade de Venâncio Aires, vizinha de Santa Cruz. Na época o índice local chegou a 37,22 casos por 100 mil habitantes. Entre 2005 e 2008 viu uma queda, mas houve um novo pico em 2011, provavelmente associado ao endividamento dos agricultores.
Integrantes do Gipas (Grupo Interdisciplinar de Pesquisa e Ação em Agricultura e Saúde), uma entidade autônoma gaúcha, lançaram então a suspeita de que intoxicações com os chamados organofosforados — substâncias presentes em vários agrotóxicos — pudessem causar depressão, levando aos suicídios.
Indícios da associação dos agrotóxicos com o suicídio
Pesquisadores da Unisc (Universidade de Santa Cruz do Sul), da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e da UFRJ (Universidade Federal do Rio) encontraram em 2001 novos indícios que reforçam a tese, mas o vilão da história pode ser outro componente.
Em vez dos organofosforados, o estudo constatou que o manganês, presente em alguns fungicidas, pode provocar danos muito mais graves. E concluiu: ‘pode-se aceitar como verdadeira a hipótese de que os agrotóxicos utilizados indiscriminadamente no cultivo do tabaco causam intoxicações e distúrbios neurocomportamentais nos membros das unidades familiares de produção’. As culturas de fumo são geralmente plantadas por pequenos produtores, assim como as de batata e morango.
Ansiedade e nervosismo nas pessoas que manipulavam o agrotóxicos
O neurologista da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) Henrique Ballalai Ferraz também constatou ansiedade e nervosismo nas pessoas que manipulavam o agrotóxico. “É possível que a intoxicação cause depressão. Faz sentido mesmo.” Ele chegou a essa conclusão em sua pesquisa à procura de sinais de Parkinson em agricultores de tomate e morango no interior de São Paulo e apontou uma relação com o manganês nos fungicidas conhecidos como ditiocarbamatos, os mesmos do fumo.
Para os pesquisadores, tanto no caso do organofosforado, como no do manganês, intoxicações agudas ou uma exposição longa aos agrotóxicos deixam sequelas neurocomportamentais que podem evoluir para um quadro de depressão. Esse quadro, aliado a uma série de problemas econômicos e sociais, poderia levar ao suicídio.
Saúde Mental
O índice de mortes é um reflexo da complicada condição de vida do agricultor. A pesquisa, realizada com 315 colonos, constatou altos índices de morbidade psiquiátrica (44%), ansiedade (65%) e de pessoas que dizem “sofrer dos nervos” (cerca de 25%).
Fonte: Cíntia Vergara dos Santos / Centro de Valorização da Vida