Dom Jacinto Bergmann: por que o carvalho cai e o bambu não?
Conta uma antiga fábula, que um carvalho, gabava-se de sua força-própria, desdenhando da aparente sem-força-própria do bambu. Açoitados por uma incremente tempestade, o bambu curvou-se aos ventos da intempérie, enquanto o carvalho afrontava as forças da natureza. Passado o temporal, o bambu seguia de pé, sustentado por suas profundas raízes ante o vendaval. O carvalho? […]
Conta uma antiga fábula, que um carvalho, gabava-se de sua força-própria, desdenhando da aparente sem-força-própria do bambu. Açoitados por uma incremente tempestade, o bambu curvou-se aos ventos da intempérie, enquanto o carvalho afrontava as forças da natureza. Passado o temporal, o bambu seguia de pé, sustentado por suas profundas raízes ante o vendaval.
O carvalho? Tombou, pereceu com suas raízes expostas, arrancadas do solo pela fúria dos ventos. O bambu “sem-força-própria”, mas com raízes profundas, foi parceiro com o vento; o carvalho “com-força-própria”, mas com raízes expostas, foi rival do vento. Acolher com humildade ou afrontar com arrogância, agir com simplicidade ou reagir com complexidade. Há quem cultive a sua “fortaleza” sem-força-própria e há que cultive sua “fraqueza” com-força-própria.
Essa antiga fábula do carvalho e do bambu, veio-me à mente, ao deparar-me mais uma vez com a Oração de Jesus, dirigida ao Deus-Pai, no Evangelho de São Mateus 11,25, trecho evangélico proposto pela Igreja para a quinta-feira desta semana, dia 13 de julho: “Eu te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondestes estas coisas aos intelectóides e entendidos e as revelastes aos simples e pequeninos”.
Essa oração, aparece, depois de Jesus, no mesmo capítulo, ter falado de João Batista como seu precursor, depois de ter anunciado que o Reino de Deus já estava presente entre o povo por meio dos evidentes sinais, como os doentes curados e o evangelho anunciado aos excluídos; depois de criticar as cidades que não conseguiam ver o que estava sendo anunciado, de não aceitarem as novidades de Deus, porque não se enquadravam em seus conceitos e sua leitura fundamentalista dos Profetas, dos Livros Sapienciais e dos Livros das Leis.
Com base na oração, Jesus tem claro que as realidades de Deus chegam somente às pessoas “simples e pequeninas”; já as realidades de Deus não chegam às pessoas intelectóides e entendidas. O ruah – “vento” de Deus assopra e o bambu o acolhe, pois é parceiro; o ruah – vento de Deus assopra e o carvalho o enfrenta, pois é rival.
Quem são as pessoas “simples e pequeninas” – o “bambu”? São aquelas que usam a razão para compreender, mas também usam o coração para acolher as realidades de Deus. E, de outro lado, quem são as pessoas “intelectóides e entendidas” – o “carvalho”? São aquelas que só usam a razão sem o coração para entender tudo, e com isso tornam-se “entendidas” de tudo, de todos e até do próprio Deus. Mais, os “simples e os pequeninos” – o “bambu”, os que não tem força própria, porque colocam toda sua força em Deus, são acolhidos pelo seu ruah: entre eles e Deus há uma parceria; os “intelectóides e entendidos” – o “carvalho”, os que tem força própria, porque dispensam a força de Deus, são derrubados pelo seu ruah: entre eles e Deus há rivalidade.
E segundo a revelação, só Deus tem força própria, Ele é o todo-poderoso, Ele possui o único ruah que assopra dando força e vida. Por isso, Ele não tolera os rivais que ousam acumular-se de força própria e dispensam a força de Deus – enfrentado o seu Ruah, como o carvalho. Ao contrário, Ele acolhe os parceiros, que não contam com força própria e colocam toda a sua força em Deus – acolhendo o seu ruah, como o bambu. Já Maria, a mãe de Jesus, rezou no seu Magnificat: “Deus derruba os ‘fortes-com força própria’ e eleva os ‘fracos-sem força própria’”.
Por que o carvalho cai e o bambu não?
Dom Jacinto Bergmann, Arcebispo Metropolitano da Igreja católica de Pelotas.