Geisa Coelho: As crianças pedem socorro
A lamentável tragédia que abriu 2020 em Canguçu e vitimou uma pequena menina, não causou alvoroço. Com pensamentos tacanhos, calamos porque “não é da nossa conta”. Ficamos sabendo da silenciosa violência ocorrida no Dia Mundial da Paz, quando vizinhos cobraram notícias e a mídia trouxe o caso a público. Não se trata de mexericos, pelo […]
A lamentável tragédia que abriu 2020 em Canguçu e vitimou uma pequena menina, não causou alvoroço. Com pensamentos tacanhos, calamos porque “não é da nossa conta”.
Ficamos sabendo da silenciosa violência ocorrida no Dia Mundial da Paz, quando vizinhos cobraram notícias e a mídia trouxe o caso a público. Não se trata de mexericos, pelo contrário; o alarde foi feito por jovens mães, indignadas e comovidas com silêncio em relação ao caso. Sabendo do abominável ato, não rezamos pela dor da bebê, não fizemos passeatas, paradas, gritarias por justiça, nem uma manifestação contra o crime… Afinal, “o problema é deles”. Deles quem? Dos bebês violentados?
Por essa omissão é que amargamos o lamentável índice de 4 crianças abusadas por hora no Brasil, mesmo que a proteção à dignidade infantil conste no artigo 227 da Constituição Federal. Dados de 2016 a 2018 apontam que naqueles anos houve 60.000 estupros no país e que 70% foram cometidos contra menores de idade.
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Se por um lado é preciso proteger a identidade infantil, por outro devemos lembrar que crianças estão sangrando nas mãos dos pedófilos. É urgente que se traga o tema à tona para que as famílias saibam que esse bárbaro crime, embora comum, é inaceitável, inclusive pelo código dos apenados.
A moderna sociedade que prioriza discutir a sexualidade dos adultos fecha os olhos para a violência sexual contra crianças, e por consequência, aos direitos de quem não pode se defender.
A mesma sociedade que luta contra o aborto, abandona os pequenos à própria sorte e aos deleites dos cruéis pedófilos, quase sempre pais, padrastos, avôs, tios, primos, amigos próximos, pastores etc., que em geral contam com o medo, com silêncio e conivência das mães.
A mesma sociedade que critica mulheres adultas estupradas à noite porque estavam na balada – o que representa menos de 30% dos casos no Brasil – oculta a violência infantil que ocorre dentro de sua própria casa para não “manchar” a honra e o nome da família.
Não pode haver modo mais cruel contra a honra de alguém do que compactuar com crime cometido contra bebês. Quem cala, consente!
Estupro é tema para causar indignação, pra ser discutido na vizinhança, nas escolas, nas igrejas, nas associações. O mínimo de informação intimidaria os covardes. Crianças e adolescentes precisam ser ensinadas que não são responsáveis pelos abusos que sofrem e que não devem calar-se e que podem contar conosco.
Nossas crianças agonizam. São silenciadas entre as paredes do “lar”. As famílias sentem vergonha de denunciar os agressores. Que pena! Seria melhor que sentissem vergonha por protegerem criminosos e por acobertarem a mais cruel violência contra um ser humano: a covarde violação do angelical corpinho infantil. Jamais um ser humano se recuperará desse trauma.
Enquanto adultos silenciam, crianças gritam de dor, de medo, de pavor!